terça-feira, 21 de agosto de 2018

Pensemos...






“...cada coisa, cada ser, cada alma, permanece no processo evolutivo que lhe é próprio. E se já passamos pelas estações inferiores, compreendendo como é difícil a melhoria no plano de elevação, devemos guardar a disposição legítima de auxiliar sempre, mobilizando as melhores possibilidades ao nosso alcance, a serviço do próximo...” (Trecho do Livro Missionários da Luz, André Luis)

“Os Espíritos não podendo melhorar-se, senão suportando as tribulações da vida corporal, seguir-se-ia que a vida material seria uma espécie de cadinho ou depurador, pelo qual devem passar os seres do mundo espírita para atingirem a perfeição?”
“Sim, é bem isso. Eles se melhoram nessas provas, evitando o mal e praticando o bem. Porém, é só depois de várias encarnações ou depurações sucessivas, num tempo mais ou menos longo, se segundo seus esforços, que eles atingem o objetivo para qual tendem.”, (O Livro dos Espíritos, Questão 196)

Podemos nos surpreender em algumas situações de nossa existência que envolve nossos irmãos do caminho ainda não devidamente compenetrados nas tarefas cristãs, presos ainda as paixões inferiores, avaliando-as como degradantes, chocantes, repugnantes, que geram em nós uma imediata aversão, misturada com sentimentos de piedade e solidariedade.

Tentamos por vezes imaginar como pode uma pessoa, um ser humano como nós, se entregar e desistir da vida, destruindo a estima por si mesmo, abdicando da vontade de lutar, entregando-se completamente, de corpo e alma, aos vícios, a promiscuidade, a alienação e a depressão.

Moradores de rua, alcoólatras, maltrapilhos, com feridas expostas e mal curadas, péssimas condições de higiene pessoal, odores insuportáveis, roupas e objetos sujos e deteriorados, viciados, drogados, jogados nos becos, sob as marquises, sob as pontes, nos antros onde a promiscuidade e a violência imperam. Jovens e idosos oriundos de todas as classes, homens e mulheres que abandonaram o lar, a família, a maioria já com imensas dificuldades de diálogo e compreensão, por terem as mentes entorpecidas pelo álcool e pelas drogas baratas, doentes, abatidos, vivendo em uma atmosfera onde a dor, o desânimo, o pessimismo, o tédio, a inércia, obscurecem o passado, esquecendo entes queridos, pessoas que lhes foram caras, sem condições de manter por muito tempo uma conversação sensata e equilibrada.

Exilados, marginalizados, párias de uma sociedade que não se importa; que simplesmente os excluem; acostumada que está em vê-los pelas ruas, pelas calçadas, pelas praças. São alvos de críticas, de desprezo, de escárnio, ou simplesmente ignorados, em um mundo onde já se tornou normal e rotineiro se ver alguém caído no chão, imóvel, com pessoas indo e vindo, apenas se desviando, como se não fosse um ser humano que estivesse ali deitado, mas, simplesmente, um fardo, sujo e imprestável, que a limpeza pública deveria retirar.

Julgados e criticados, pejorativamente rotulados, conceituados, são vadios, preguiçosos, fracos, covardes, merecem quando muito, atiradas com indiferença ou soberba, algumas moedas ou piedosamente, a sobra de algum laudo jantar no restaurante.

Vivem de favores, de caridade, de pequenos furtos, de degradantes tarefas, considerados inoportunos, chatos, inconvenientes, motivo de chacota, de agressão, da violência e do escárnio daqueles que não conheceram a dor, o sofrimento, a decepção, que não compreendem que não somos todos iguais, que nem todos conseguem lidar com a derrota, com a perda, com o abandono, com a traição da mesma maneira, quando, então, encontram nas ruas a fuga, a enganosa solução para aquilo com que não tiveram forças para lutar, suportar, superar.

Feliz de quem consegue, de quem vence seus medos, de quem tem a força e a coragem de reverter as difíceis situações que, por vezes, a vida apresenta, porém, mais feliz ainda são aqueles que, além dessa superação individual, conseguem compreender e auxiliar aqueles que não são tão fortes e determinados como eles, entendendo que cada um atravessa um estágio evolutivo diferenciado, e que, aquele que hoje vive nas ruas, pode ter sido ontem, em outra vida, um ente querido de seu coração, ou até ele mesmo, em pretérita existência, antes de adquirir a coragem e a fé que hoje tem para vencer os desafios e deles não mais precisar fugir.

Esses exemplos também são encontrados no plano espiritual, onde espíritos culpados, fracos, inseguros, se entregam aos mais variados vexames e sofrimentos por se julgarem merecedores, por não suportarem os reclamos de suas consciências pelos erros e crimes cometidos, surtam, viram, também lá, alienados, desequilibrados, ficando a mercê de forças inferiores, voltadas ao mal, que usam e abusam do poder de manipulá-los, tornando-os escravos e cúmplices obrigatórios de seus desvarios.

Se hoje, já conseguimos compreender, assimilar, e com muito esforço, vivenciar as verdades cristãs, os conceitos espíritas, nos cabe o dever de estender as mãos e auxiliar a estes irmãos do caminho que ainda, por falta, principalmente, de fé em Deus e em sua bondade, preferem se entregar ao ostracismo, a doença, a loucura, ao destino, aos vícios, em vez de lutar e enfrentar seus medos, suas fobias, suas culpas, seus fracassos, suas decepções.

Temos que auxilia-los, sem sermos coniventes com suas enfermidades, ajudar a se reerguerem, não nos preocupando em julgar, em conhecer motivos, mas, em estender para eles o futuro, o que podem ainda fazer, o que podem mudar, tanto aos nossos irmãos encarnados, como aos maltrapilhos desencarnados, orando, ensinando, agindo e interagindo, para que reflitam sobre seus passos e reajam contra seus próprios desequilíbrios, renovando seu modo de pensar, de enxergar a vida, auxiliando-os a amarem a si mesmos, e, posteriormente, reaprenderem a amar ao próximo e a Deus, em uma batalha constante, pacífica, contínua, onde todos aqueles que algo aprenderam e assimilaram do bem, cumprem o dever de repassar e trazer para junto de si aqueles que ainda se destroem, aqueles que continuam fugindo de suas responsabilidades.

Odores, feridas, distúrbios, chagas, razões e intenções, se Jesus tivesse parado um único segundo para pensar nesses detalhes como impedimento para suas ações, seriam mínimos os efeitos de seus exemplos e de seus ensinamentos para a humanidade.

Um sorriso, um abraço, uma pergunta, uma resposta, um segundo de atenção, uma moeda acompanhada com um “bom dia”, com um “fica com Deus”, faz uma diferença mínima em nossa existência, mas, pode representar a faísca que irá acender o pavio que levará ao nosso irmão do caminho a acreditar que ele ainda é alguém, que ainda é um filho de Deus, lembrança talvez suficiente para transformá-lo para sempre, fazendo-o retornar ao caminho evolutivo que todos nós, mais cedo ou mais tarde, teremos que percorrer e avançar.

Pensemos.