sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

O Coma




CENA 01



Começa a cena com Alice ansiosa, preocupada, entra no palco a Dra. Beatriz.



Alice

Como está minha mãe, Dra. Beatriz?

Dra. Beatriz

Calma, Alice, o acidente que Dona Laura sofreu foi muito grave! Fizemos tudo ao nosso alcance para salva-la, se você crê em Deus, tenha fé, só depende Dele agora sua recuperação...

Alice

Desculpe doutora, mas prefiro acreditar na senhora, minha mãe mesma nunca acreditou neste Deus e nos ensinou que só depende de nossa força de vontade para atingirmos nossos objetivos, somos materialistas e a fé que a senhora me pede, infelizmente em nada poderá ajudar, mas seja sincera, como ela está?


Dra. Beatriz

Seu estado é estável, só que infelizmente sua mãe, apesar de ter suportado a operação, entrou em coma profundo, só nos resta esperar que ela reaja, tudo que a ciência pode fazer foi feito, agora só depende dela...


Alice

O que posso fazer para ajudar? Diga-me doutora, farei qualquer coisa para ter minha mãe de volta...


Dra. Beatriz

 Bem, estudos já revelaram que em alguns casos, a presença de pessoas queridas tem ajudado aos pacientes retornarem do coma, só posso aconselha-la a ficar sempre do lado de sua mãe, lhe dar muito carinho e conversar bastante com ela, lhe dizer o quanto a ama e quanto faz falta a sua presença, não posso garantir que ela melhore, mas com certeza isso não fará com que piore...


Alice

Farei isso doutora, obrigada, e se este Deus realmente existir que possa se apiedar do nosso sofrimento e traze-la de volta para nossos braços...

(apagam-se as luzes)


CENA 02



Acende-se a luz, Dona Laura está em um jardim, caminha lentamente, assustada, olhando à sua volta, vai até um banco e senta-se, ouve então a voz de Alice.



Alice(voz)

Mãezinha, volte para nós, .amamos muito você, precisamos de você, volte, por favor, não nos deixe...volte...volte...volte...


Dona Laura

Alice...é você minha filha? Onde você está? O que mais quero é voltar, não sei onde estou, onde está você minha filha? Fale comigo!



Silêncio, ela espera por uma resposta, vê um banco próximo, senta-se.

Dona Laura

Não consigo entender, ouço sempre Alice, mas, não consigo encontra-la, o que está acontecendo afinal? Estou há um bom tempo neste hospital, mas não conheço ninguém, não recebo visitas....(pausa)...lembro que estava varrendo a calçada, de repente aquele carro virou a esquina, os rapazes gritavam, brincavam, o carro derrapou, veio em minha direção e tudo se apagou, foi horrível, acordei aqui...sou muito bem tratada é verdade...só não entendo porque minha família não me visita, sempre que pergunto por eles pedem para ter um pouco mais de paciência...até quando que terei que esperar...


Dr.Orlando entra em cena, caminha até ela, pondo a mão em seu ombro, Dona Laura sorri.


Dona Laura

Dr. Orlando! Que bom vê-lo e minha família quando virá me ver? Quando terei alta? Sinto-me tão bem...


Dr.Orlando

Calma, Dona Laura, tudo à seu tempo, tenha um pouquinho mais de paciência....


Dona Laura

Eu tenho, só não entendo porque tanto mistério, sei que sofri um acidente, mas já estou bem, estou completamente recuperada e tão rápido, este hospital é muito bom, as pessoas são muito eficientes e atenciosas...


Entram em cena Rita e Maria do Carmo, caminham, passeando pelo jardim.


Dr.Orlando

É que as pessoas que vem para este hospital já possuem um remédio dentro de si que cura a maioria dos males, o amor no coração! E a senhora sempre foi muito boa, por este motivo sua recuperação é assim mesmo, rápida...


Dona Laura

Ora doutor eu até agradeço os elogios, apesar de achar que não os mereça, mas me desculpe, só o amor não poderia ter evitado que pelos menos eu estivesse com vários arranhões no corpo, afinal fui atropelada e veja...(mostrando os braços)...não tenho nada...


Dr. Orlando

Mas os arranhões estão exatamente onde você disse que eles deveriam estar, no seu corpo...


Dona Laura

Onde Doutor? Onde estão que não os vejo e nem os sinto?


Ele olha em volta pensativo, quando vê Rita e Maria do Carmo, sorri.


Dr.Orlando


Vê aquelas moças ali, Dona Laura? Vamos até elas, quem sabe que com alguns exemplos possa entender o porquê de sua rápida recuperação...


Eles se levantam e caminham até onde elas estão.


Dr.Orlando

Dona Laura, estas são Rita e Maria do Carmo, também nossas pacientes e como já estão aqui há mais tempo tenho certeza que poderão ajuda-la!


Rita

Como está, Dona Laura? Pode contar conosco enquanto estiver por aqui, não sei se poderei ajuda-la, como disse o doutor, mais farei tudo que estiver ao meu alcance!


Maria do Carmo

Isso mesmo! Muito fomos ajudadas desde que chegamos a esta instituição e nunca nos pediram nada em troca, qualquer coisa que pudermos fazer, será uma benção de Deus...


Dr.Orlando

Tudo que vocês receberam aqui foi conquistado por direito, nada nos devem, só estão colhendo o que plantaram durante suas vidas, quem planta amor só pode colher amor...


Dona Laura

 Muito agradeço por quererem me ajudar mesmo sem me conhecer, isso é difícil de encontrar hoje em dia, as pessoas estão totalmente alienadas, manipuladas sem perceberem, levadas a acreditar que devem pensar apenas em si mesmas, tendo como objetivo, apenas as conquistas materiais, por este motivo é que não acredito que exista um Deus, Ele não poderia ficar tão impassível diante do egoísmo e da maldade existente no mundo...


Dr.Orlando

Realmente a senhora está com a razão, no que diz respeito às pessoas, quanto a Deus, quem somos nós para questionar seus atos? Se não conseguimos enxergar nada além de nossos problemas pessoais, o que dirá do destino do mundo e da humanidade?

Rita

É a mais pura verdade, doutor! Como duvidar da bondade e da existência de Deus? Desde que aqui cheguei só tenho recebido carinho e proteção, mesmo sabendo que em outras regiões existem irmãos nossos em pleno sofrimento e desespero, se não fosse pela minha fé e resignação durante todo o tempo que sofri na Terra, com certeza não estaria aqui neste lindo lugar, me preparando para seguir no trabalho, só não sei ainda se vou retornar ou não, aguardo instruções superiores...


Dr.Orlando

E você Maria do Carmo, o que acha? Deus existe ou não?


Maria do Carmo

Ora doutor, que pergunta! Se Ele não existisse como estaríamos aqui? Apenas sua infinita bondade poderia nos dar tantas oportunidades para recomeçar e corrigir nossos erros...


Dona Laura

 Concordo que devemos procurar não errar e quando o fizermos, assumir as responsabilidades, mas isso é normal nas pessoas de boa índole, só que tem alguns que não tem jeito, são de tal forma, ruins, que só a morte mesmo resolve...”pau que nasce torto, morre torto”...


Maria do Carmo

Por este motivo que é bendita a oportunidade do recomeço, assim eles poderão resgatar seus erros...


Dona Laura

Depois de mortos? Como?


Dr.Orlando

Dona Laura, na verdade ninguém morre, apenas troca de vestes, deixam o corpo material na Terra e reassumem a sua verdadeira veste, a espiritual, o recomeço que Maria do Carmo está se referindo é o ensejo de reencarnar que todos nós temos...


Dona Laura

 Reencarnar? Tenho alguns amigos espíritas que vivem falando sobre isso, reencarnação, mas por mais que esta ideia seja boa, eu não acredito, morreu, morreu e pronto...


Rita

 Mas como à senhora estando aqui não acredita? Quer uma prova maior?


Dona Laura

Mais o que o fato de eu estar internada aqui tem a ver com isso? (assustada)



Rita olha para o Dr.Orlando, preocupada em ter dito algo inconveniente.



Dr.Orlando

Dona Laura, lembra quando me perguntou sobre estar tão bem, apesar do acidente?


Dona Laura

Claro que sim e é de estranhar mesmo...


Dr.Orlando

E sobre o fato de ouvir sua filha e não avista-la?


Dona Laura

Outra coisa que não consigo entender...


Dr.Orlando

 Dona Laura...preste bastante atenção...


Dona Laura


Esperem um pouco, estou ficando assustada com esta conversa, estou louca ou pelo que entendi vocês estão tentando me dizer delicadamente que estou...morta? Não pode ser...eu não disse isso...devo estar é louca mesmo...e vocês também...


Dr. Orlando

 Nem uma coisa e nem outra, louco nenhum está com certeza e muito menos mortos, pode me beliscar se quiser, estou bem vivo, simplesmente porque a morte não existe, pelo menos não como a senhora imagina...


Rita

 Isso mesmo, Dona Laura, a morte como imaginávamos não existe, estamos apenas em planos diferentes, que se entrelaçam e interferem-se constantemente...


Maria do Carmo

 Não precisa se assustar, Dona Laura, a senhora logo vai se acostumar e gostar daqui, é um lindo lugar...uma linda escola...



Dona Laura

 Nossa! É inacreditável, sempre pensei que com a morte tudo estivesse encerrado, então Deus realmente existe e Ele é muito maior que todos imaginam...


Dr.Orlando

Sim, Dona Laura, o difícil é pensarmos assim quando estamos envolvidos no drama da vida, geralmente as pessoas só se lembram disso na hora da dor...o que é uma pena...


Dona Laura

Mas todos que morrem vêm para este lindo lugar? Se soubesse teria morrido antes...brincadeirinha...


Dr. Orlando

 Pelo contrário, infelizmente a morte não modifica ninguém e cada um vive aqui da mesma forma que gostava de viver na Terra, com eu disse antes depende da semeadura, colhemos o que plantamos, quem semeia ódio tem que colher a dor, a lei é inexorável...


Maria do Carmo

 Existem lugares aqui que podemos comparar ao inferno, como é descrito pela igreja, com a diferença que o “diabo” está dentro de nós mesmos...


Dona Laura

 Como assim?


Maria do Carmo

 Quero dizer que o nosso maior algoz é a nossa consciência, podemos até engana-la por um tempo, mas um dia ela se erguerá e não teremos como fugir do remorso, que nos devorará, até estarmos quites com todos os débitos contraídos...


Dona Laura

 Então eu não deveria estar aqui, não acreditava em Deus...


Rita

 Essa é a diferença, aqui o que vale é o que fazemos, são nossos atos que determinam nossa conduta e não simples crenças, a senhora sempre acreditou em Deus, faltava apenas um “empurrãozinho” para admitir...


Dr.Orlando

A senhora sempre agiu de forma cristã, mais vale um ato de caridade do que mil novenas, ”palavras o vento leva”, as obras estarão sempre de pé para mostrar o que realmente somos, por isso quanto mais esforço que dedicarmos a elas, mais sólidas elas se tornarão...é a lei...


Dona Laura

 Nossa! Tudo para mim é novidade, tudo tão lindo, tão lógico, mas eu nada fiz para merecer estar aqui, nunca fiz mal a ninguém é verdade, mas também não me lembro de ter feito nada de bom, a não ser para minha família e amigos, é claro, mas isso quem não faz?


Dr.Orlando

 Tem certeza, Dona Laura? Feche os olhos, vou ajuda-la a recordar um pouco só de sua vida...feche os olhos...relaxe...



Ela fecha os olhos, enquanto ele, com as mãos espalmadas sobre sua cabeça, se concentra, Rita e Maria do Carmo também fecham os olhos e assumem uma atitude de oração, acende-se dois focos de luz, um em cada extremidade do palco, onde estarão Carolina e Bruna (criança) respectivamente, olhando fixamente para a platéia.



Carolina


Não sei o que teria sido de minha vida se não fosse Dona Laura, um dia estava pronta para entrar em uma casa onde morava uma médica que praticava abortos, na época eu tinha quatorze anos e estava grávida de meu namorado, que desesperado, tanto quanto eu, me arranjou o dinheiro para tirar aquela criança, quando eu estava prestes a entrar, minhas pernas tremeram, fraquejei, entrei em desespero e comecei a chorar, foi naquele momento que surgiu aquele anjo de mulher, que mesmo sem me conhecer chegou perto de mim e perguntou o que eu estava sentindo, se podia ajudar, eu não suportei e entre soluços contei minha historia e supliquei que me ajudasse, ela me levou para sua casa, enxugou minhas lágrimas e me mostrou sua filha recém-nascida e o que eu perderia se quisesse continuar com meus planos, convenceu-me a ter meu filho, me acompanhou até em casa e me ajudou quando contei para os meus pais, que não só me perdoaram, como me ajudaram a criar meu filho...cresci...meu filho já é um homem, um médico pediatra, que percorre os bairros mais pobres socorrendo as crianças, buscando minimizar suas dores e suas fraquezas...


Bruna


 Um dia eu estava no farol vendendo flores, chovia muito, estava muito frio, ela me levou para sua casa, me deu banho, um prato gostoso de comida, um bolo, algo que nunca vou esquecer, outro dia passou no farol e me levou uma boneca de presente, foi minha primeira boneca, todo dia ela passava por lá, me dava lanche, comprava rosas, eu adoro Tia Laura...



Apagam-se os focos, a luz retorna ao normal, Dona Laura abre os olhos, suspira e chora silenciosamente.



Dr.Orlando

Chore irmã, as lágrimas de amor são flocos de luz que percorrem o espaço e vão direto para Deus...


Dona Laura

Mas isso é tão pouco, existe tanto sofrimento no mundo...isso são migalhas...


Rita

E este é o nosso trabalho aqui, espalhar migalhas, que juntas um dia reformarão a humanidade, estamos nos preparando para ingressar em expedições socorristas que irão aos lugares de sofrimento para minimizar a dor de nossos irmãos, daqueles que ainda não conseguiram se superar...


Dona Laura

E eu? Será que também não poderia ajudar?


Dr.Orlando

Claro, agora mesmo existe alguém que precisa muito de ajuda, mas precisamente de sua ajuda...


Dona Laura

 Minha ajuda? Mas quem? Não importa, vamos logo, doutor, onde ele está?



Dr. Orlando

Calma, Dona Laura, vamos sim, meninas nos deem licença, logo estaremos de volta...


Rita

Claro, doutor, esperaremos aqui, em oração, para ajuda-los...


Dr.Orlando

Então vamos, temos um bom caminho a percorrer...


Apagam-se as luzes.



CENA 03


Acendem-se as luzes, o palco está em penumbra, vários sofredores estão deitados no chão, alguns gemem, outros falam palavras sem sentido, acende-se um foco onde estão Dr.Orlando e Dona Laura.


Dona Laura

Meu Deus! Pobres criaturas, onde estamos? No inferno? Ele existe afinal?


Dr.Orlando

Sim, ele existe, mas está dentro de nós mesmos, aqui, por afinidade, se reúnem alguns espíritos que sofrem, não são maus, apenas cometeram erros que não conseguem esquecer, existem lugares bem pior que estes...


Dona Laura

Mas porque não os socorrem? Afinal qual de nós nunca errou?


Dr. Orlando

Eles serão socorridos, mas antes eles têm que querer, a dor é um bendito remédio e quando se voltarem para Deus com o firme propósito de recomeçar, serão socorridos...veja...(aponta para Raul)...não reconhece aquele rapaz?



Dona Laura

Não, eu o conheço?


Dr.Orlando

Conhecer não é bem o termo, nos aproximemos, vamos ouvi-lo...


Eles se aproximam de Raul, que está de joelhos, gemendo, o doutor, passa a mão em sua cabeça.




Dr.Orlando

Raul, meu caro Raul, por que sofres?


Raul

Quem está ai? Por favor, me ajude, eu matei, sou um assassino, eu matei...


Dr.Orlando

Você? Um assassino?


Raul

Sim, não sabia? Todos devem saber, eu matei, não queria mais matei...


Dr.Orlando

Quem, meu filho?


Raul


Aquela senhora, eu tinha bebido, era uma festa, meus amigos não queriam que eu fosse embora dirigindo, mas eu ri, nada me assustava, nada me detinha, entrei no carro e arranquei, voava pelas ruas, era o maior, de repente a curva, eu estava muito rápido, perdi o controle, subi na calçada e a matei, meu Deus, me perdoe, se ela pudesse me perdoar, se ela pudesse me perdoar...



Dona Laura vai até ele, se ajoelha e deita a cabeça dele em seu colo, chora silenciosamente.



Raul

Quem está ai? Por que chora? Não tenha pena de mim, eu não mereço, sou um criminoso, um assassino...


Dona Laura

Não meu filho, você não é, apenas cometeu um erro, apenas isso, não teve a intenção, Deus com certeza já o perdoou, como eu também já o perdoei, meu nome é Laura, era eu na calçada...


Raul

A senhora? Então eu não a matei?


Dona Laura

A morte não existe meu filho, nem para mim e nem para você...


Raul

Que bom, a senhora me perdoou, quero voltar, cansei de fugir, quero voltar para casa, venha comigo Dona Laura, venha conhecer meus pais, meus irmãos...


Dr. Orlando

Sim, logo todos nós iremos, mas agora é importante que descanse, vamos leva-lo a um hospital para trata-lo, logo estará bom...


Raul

Sim, eu vou, ela me perdoou...me perdoou...


Dona Laura se levanta e se abraça ao doutor, chorando, apagam-se as luzes.





CENA 04


Acendem-se as luzes, eles estão de volta, onde estão Maria do Carmo e Rita.

Maria do Carmo

Parabéns, Dona Laura, é difícil perdoarmos aqueles que por irresponsabilidade nos ferem...



Dona Laura

Para mim nunca foi, nunca julguei ninguém, busquei sempre procurar justificativas para quem queria me prejudicar, no fundo são todos doentes...


Rita

Sim, para a senhora pode parecer normal perdoar, mas para a maioria das pessoas não, elas preferem utilizar o verbo vingar...
Dona Laura: Pois eu prefiro o verbo ajudar, e tem muita gente ainda precisando de ajuda, só lá naquele vale são dezenas, vamos me digam, como faço para entrar na equipe de vocês? Quero aprender, quero trabalhar...



Dr.Orlando

Chegamos ao ponto principal da questão, é claro que poderá ajudar, poderá ingressar em nossa equipe e começar a trabalhar, méritos para isso a senhora têm, temos apenas um problema a resolver...



Neste momento ouve-se a voz de Alice ao fundo.



Alice(voz)

 Mãe! Volte para nós, por favor, são seis meses mamãe, estamos com saudades, nós te amamos, precisamos de você, não desistiremos nunca...venha...venha...



Dona Laura olha assustada à sua volta.



Dona Laura

É minha filha, ouço sempre sua voz, vocês ouviram também?  Ela pede que eu volte, como pode ser? Por favor, doutor, ajude-me...


Dr. Orlando

Preste bastante atenção, Dona Laura, a senhora ainda não desencarnou...


Dona Laura

Não? Acho que estou louca, primeiro querem me convencer que aqui é o outro lado, onde vivem os que já morreram, agora dizem que ainda não morri, afinal, estou morta ou viva?


Dr. Orlando

Viva a senhora está, pode ter certeza e encarnada também, por enquanto, o seu corpo material encontra-se no hospital, em estado de coma e o seu espírito aqui está, conosco, a voz que ouve é realmente sua filha, que pede para que retorne...


Dona Laura

Mas isso é possível?


Dr. Orlando

No seu caso sim e além do mais a senhora poderá decidir, se prefere continuar a viver com sua família ou descansar seu corpo material e vir trabalhar conosco...


Dona Laura

Eu decidir? Aqui é tão lindo, com tanto trabalho a fazer, tantas coisas novas, lá me sinto tão inútil, com os filhos criados, morando sozinha...


Rita

Isso quer dizer que a senhora prefere ficar?


Dona Laura

Não...não....estou apenas pensando e minha filha? Meus filhos, os meus netos, sempre lhes dei muito amor, ensinei-os a serem pessoas de bem, mas esqueci do principal, eu me esqueci de apresenta-los à Deus, ao nosso Pai, eles são materialistas como fui, eu lhes ensinei, este é um erro que tenho que corrigir, que tenho que remediar, me perdoem, por favor, me perdoem, mas preciso voltar, eles precisam saber, não posso ficar, não posso, me perdoem, por favor...


Maria do Carmo neste momento vai até ela e a abraça.


Maria do Carmo

Perdoa-la porque, irmã? Por amar?


Rita

Vá com Deus, Dona Laura, pense sempre em nós, estaremos sempre prontas a ajuda-la no caminho que ainda falta percorrer...


Dona Laura


 Dr. Orlando...eu...(começa a chorar)


Dr. Orlando

As palavras são desnecessárias aqui Dona Laura, a luz que sua alma irradia fala por si, até breve irmã e não se esqueça de nós...
Dona Laura: Nunca esquecerei, hoje foi o dia mais importante de minha vida, adeus, digo, até breve, levarei vocês em meu coração e nas minhas orações, agora eu sei a importância delas, agora eu sei...



Apagam-se as luzes.



CENA 05



Acendem-se as luzes, o cenário é o quarto do hospital, Cristina está sentada ao lado da cama, cochilando, Dona Laura começa a gemer e a se mexer, a filha desperta alarmada.


Cristina

Mamãe! Você voltou, eu sabia, você voltou, sempre acreditei, sempre tive esperança, sempre tive fé...



Dona Laura abre os olhos e vê a filha, sorri, ela a abraça, chorando.



Cristina

Você voltou mamãe, você voltou para nós, por nós, graças a Deus...


Dona Laura

Deus, minha filha? Você disse Deus?


Cristina

Sim, mamãe, eu sei o que a senhora pensa sobre isso, me perdoe, mas só Ele poderia trazê-la de volta, só Ele poderia...


Dona Laura

Calma, minha filha, não se preocupe, não tenho o que perdoar, temos muito que conversar, muita coisa mudou...muita coisa mudou....




Elas se encaram por alguns segundos, voltam a se abraçar, chorando, a luz vai se apagando gradativamente.



Cai a cortina.






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